quinta-feira, 28 de julho de 2011

Menu pra turista







Sei que cozinhar é viajar. Na nossa própria terra ou bem longe dela. Hoje, a proposta é dar uma voltinha. Quem serve de guia são três famosas cozinheiras francesas, conhecidas como Soeurs Scotto, que chegaram muitas vezes a uma fórmula eficientíssima. Suas receitas são sempre criativas, saborosas, práticas.


Inspiradas numa receita indiana, criaram essa espécie de moqueca de camarão e legumes superfácil de fazer, e deliciosa. 


Para os que me conhecem e sabem que não como camarão, por mil razões, esclareço que a versão vegetariana - simplesmente suprimindo os crustáceos - é excelente. 


A receita original leva um quilo e meio de camarões médios, limpos; umas 4 batatas, 500g de ervilhas congeladas (Bonduelle), 3 tomates sem pele e sementes, cortados em cubinhos, leite de um coco (em último caso, uma garrafinha de leite de coco industrializado), 2 colheres de sopa de curry em pó, folhinhas de manjericão fresco.


Dissolvo o curry num pouco do leite de coco, deixo levantar fervura. Acrescento o restante do leite de coco, junto os camarões. As batatas cortadas em gomos, ponho em água fervente com sal, até que fiquem praticamente cozidas. Mergulho as ervilhas por uns 3 minutos, também em água fervente. Escorro. Junto as batatas e as ervilhas aos camarões. Junto os tomates, tempero com sal e pimenta. Assim que os camarões perdem a transparência, desligo o fogo. Salpico de folhinhas de manjericão. Se a versão for vegetariana, é bom ficar de olho para que os legumes fiquem cozidos, mas firmes.


Para acompanhar, um arroz basmati. Fecha. 






De sobremesa, vale uma tigelinha de frutas e creme com calda de manga. As frutas podem ser as da estação. Um mix. Para a calda de manga: 1 manga cortada em pedaços pequenos e 2 xícaras de chá de jasmim. Cozinho a manga no chá, por uns 30 minutos. Bato no liquidificador e passo pela peneira. Reservo na geladeira.


Para o creme, de fato um crème brûlée: 10 gemas batidas com 1/2 xícara de açúcar, acrescento 2 xícaras de creme de leite fresco e cozinho em banho-maria, como se fosse um mingau, mexendo sempre. A mistura deve dobrar de volume. Quando estiver cobrindo a colher de pau, está no ponto. Deixo esfriar.


No fundo do copo, as frutas tropicais. Por cima, o creme. Polvilho o creme com açúcar cristal e passo o maçarico. Cubro com pedacinhos de fruta, uma folhinha de hortelã, e sirvo a calda de manga à parte.




Alguém tem um mapa?

sábado, 23 de julho de 2011

Tajine das 1001 noites





Tajine, o prato tradicional marroquino, pode nos levar a ter 1001 sensações. De prazer, claro.


O cozimento lento e harmonioso da carne, dos legumes e das frutas cria uma alquimia muito interessante. Na verdade, cria um novo sabor a partir dos sabores que se juntam. 


A marroquina Fatéma Hal ensina o método tradicional e pratica essa cozinha em seu restaurante parisiense, La Mansouria, há algumas décadas. Encontrou um lugar entre as estrelas da alta gastronomia justamente porque homenageia as cozinheiras tradicionais de sua terra, preserva as técnicas ancestrais de Fès e de outros centros, e reverencia a sua cultura.


Mas tajine é prato simples, basta seguir o método, que exige rigor em relação às temperaturas, sempre um fogo baixíssimo, paciência máxima e delicadeza de gestos.


Sem resistir, siga os passos: corte em pedaços uma galinha caipira de 1,600kg. Aqueça um pouco de óleo numa panela de fundo grosso, acrescente um pau de canela, uns 12 estigmas de açafrão ou 3 colheres de chá de açafrão em pó, duas cebolas cortadas em fatias finas, e a galinha. Tempere com sal e pimenta. Deixe dourar um pouco, virando os pedaços de galinha. Cubra com água e cozinhe em fogo brando por uma hora, ou um pouco mais se a galinha é mesmo de terreiro.


Quando a galinha estiver cozida, retire-a da panela. Reserve. Dispense o pau de canela.


Junte umas 350g de ameixas sem caroço, na mesma panela, com 1 colher de chá de canela em pó, 100g de açúcar e 100g de manteiga. Acrescente 1/2 xícara de água. Cozinhe em fogo brando até obter um molho cremoso. 






Volte com a galinha pra panela e cozinhe por mais 15 minutos. Acrescente uma pitada de Ras-el-Hanout ou Harissa. Sirva a tajine numa travessa grande ou na panela tradicional de cerâmica, arrumando os pedaços de galinha no molho e salpicando as ameixas de sementes de gergelim. 


Se a atmosfera da mesa levar a uma boa conversa, ao estreitamento de laços de amizade, ou mesmo de amor, a viagem está completa. A comida tem essa qualidade: pode nos transportar para  qualquer lugar. É um tapete mágico.








P.S.: O procedimento é semelhante para qualquer tajine: pato confit com figos frescos e damascos, galinha com limão confit e azeitonas, carneiro com ervilhas frescas, camarões com funcho. Acompanhadas com couscous, essas tajines nos levam pra lá de Marrakesh. É um prato sem fronteiras! Escolha e aproveite.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Cogumelos estimulantes





Esqueça se pensou que vai rolar uma receita alucinógena!  


Sei que alguns indígenas do sul do México consideram os cogumelos sagrados; que na Sibéria, a espécie conhecida como mata-moscas é usada para prever o futuro...e muito doidão diz que fez viagens incríveis tomando chá de cogumelos. Alguns nem voltaram.  


Tenho interesse nos cogumelos comestíveis, nos que produzem um encantamento sem alteração da consciência. Aqui na nossa tenda não prometemos trazer o seu amor de volta em três dias, nem dizer se é mesmo essa a pessoa, mas garantimos que os cogumelos que chamamos champignons de Paris, associados ao manjericão, têm o poder de despertar as papilas e são um excelente estimulante. Nada mal...


Gosto de fazer essas delícias de cogumelo ao manjericão, uma receita simples de flan, mas infalível, quando sinto a imunidade baixar, a minha ou a dos outros, seja por estresse, paixão ou crise existencial.


Num wok ou frigideira grande, vou saltear os cogumelos picados num pouco de azeite e manteiga, com um dente de alho espremido. Fogo alto. Salpico de folhas de manjericão picadinhas. Reservo.


Pré-aqueço o forno. Numa tigela, bato 3 ovos inteiros com 200g de creme de ricota (acredite, o creme de ricota Tirolez não faz feio), uma colher de creme de leite fresco, sal, pimenta=do-reino, uma pitada de cinq épices [anis estrelado, cravo, canela, funcho e pimenta] e um punhado de nozes picadinhas (sempre passo pelo forno por uns 2-3 minutos qualquer castanha a ser utilizada porque realça o sabor, faz mesmo uma diferença).




Asso os flans por 30 minutos em forminhas untadas com manteiga. Espero esfriar um pouco e desenformo. À parte, levo ao fogo brando o suco de um limão com algumas folhas de manjericão. Vou acrescentando manteiga em pedaços, batendo sempre, até formar uma emulsão. Umas duas colheres de manteiga são suficientes. 


Rego cada flan com essa manteiga de manjericão, e espero acontecer as transformações. 

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Bolo preto-e-branco





Amo chocolate. Esse bolo preto-e-branco é para quem tem a mesma paixão. 


Derreto 600g de chocolate meio-amargo com 200g de manteiga, em banho-maria. Calma, não precisa se assustar com esses números. Estou propondo um mimo de aniversário, não é pra comer todo dia! Todo dia, quem quer manter a forma toma sucos de vegetais, come frutas, sementes, grãos, verduras e legumes. Todo mundo sabe disso. A receita é pra hora do pecado mesmo.


Separo as claras e as gemas de 10 ovos. Os mais caipiras e mais frescos que encontrar. As gemas, misturo com 180g de açúcar, uma pitada de bicarbonato e 3 colheres de sopa de farinha de trigo. Bato vigorosamente. Misturo ao chocolate derretido com a manteiga. Bato as claras em neve, sem exageros. Incorporo-as à mistura de chocolate. Asso em forno pré-aquecido, em formas untadas e enfarinhadas, por 22 minutos, no máximo.


O recheio pode tomar muitos caminhos. Escolhi o que era mais simples: mascarpone ligeiramente batido com 1 colher de açúcar. Em noites de gala, o recheio seria também de chocolate, uma versão remix da mousse de chocolate. Uma geléia de frutas cítricas com uma bebida tipo Cointreau também fica super.


Para o glacê de cobertura, bato 3 claras em neve com um pouco de suco de limão e 300g de açúcar, em banho-maria, idealmente numa cul-de-poule, aquelas tigelas de fundo arredondado,  por 7 minutos. Uso uma espátula para cobrir o bolo com esse merengue.









quinta-feira, 14 de julho de 2011

Torta de noz pecã


Guarapari, 1994. Fiz amigos queridos no Espírito Santo, amigos de verão, de muitos verões. Uma delas, a Angela,  lembrou que eu fiz pra ela, quando estava grávida do segundo filho, hoje com 17 anos, essa tortinha de noz pecã. A memória não falha, e espero que esta seja a sua madeleine, evocadora de boas lembranças involuntárias, de registros de prazer, lembranças sem melancolia.


A massa da base é a pâte brisée. Elegi a receita do Daniel Boulud como a massa ideal: 9 colheres de sopa de manteiga sem sal, temperatura ambiente; 1 xícara mais 2 colheres de sopa de açúcar de confeiteiro; 1 3/4 xíc. de farinha de trigo; 1 ovo ligeiramente batido; 1 pitada de sal. Faça uma bola com a massa, embrulhe num plástico e deixe na geladeira por uma hora, no mínimo. Essa pausa na geladeira torna a massa mais maleável...O recheio: levo ao fogo 1 xícara de xarope de milho (Karo), 1 xícara de açúcar e 100g de manteiga. Desligo o fogo assim que a manteiga derrete. Junto 3 ovos ligeiramente batidos (com o garfo mesmo, rapidinho), uma pitada de sal e uma xícara de noz pecã, em pedacinhos. A receita manda acrescentar 1/2 colher de chá de essência de baunilha. Eu, no máximo, uso o açúcar de baunilha (sempre guardo uma fava de baunilha dentro do vidro de açúcar. Perfuma, magnificamente, sem artificialidades.) 


Forno a 200ºC, por 35 minutos.




Hoje, preparei o recheio com melado. Com o Karo, um xarope de milho, talvez fique mais próximo da pecan pie original, posto que essa torta é típica do sul dos Estados Unidos, grande produtor de milho... Mas, sinceramente, gosto do sabor mais rústico do melado. Faça a sua escolha. 

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Lassi de manga, geléia de pimentão e filés de pato com laranja.



Acordei com desejos de amarelo. Preparo um lassi de manga, pra começar bem o dia. Faz sol e eu recarrego as minhas baterias. Sim, são solares.

O lassi é feito com uma manga, um copo pequeno de iogurte, 1 colher de chá de mel e cubos de gelo. Bato tudo no liquidificador. Fica sensacional. E desde a alforria dos negros, não tememos misturar manga com leite...


Mais tarde, podemos pensar num sanduíche. Já preparei - prevendo o dia ensolarado - uma geléia de pimentão amarelo. Claudia, uma amiga brasileira-italiana, mezzo mezzo, já me serviu com ricota, mas acho que compõe uma bela dupla com o queijo de cabra.

Cozinhei 1 kg de pimentão, sem sementes e sem as membranas, em um pouco d'água. Fiz uma calda de açúcar a 30%, quer dizer, 30% de açúcar para 70% de água. Juntei à calda o pimentão cozido, já sem a pele. Deixei ferver até que a consistência fosse de uma marmelada. Acrescentei alecrim fresco nos momentos finais. Deixei esfriar um pouco e guardei num vidro escaldado.







Pego o melhor pão que tiver em casa. Corto ao meio e levo ao forno para tostar. Esfrego um dente de alho superficialmente sobre a torrada, espalho o queijo de cabra fresco por cima, e finalizo com uns caminhos de geléia de pimentão. Fica muito bom. Não temam: a geléia é suave, a digestão, tranquila.


Para a noite, pode ser que filés de pato com laranja fechem com chave de ouro o menu do dia. Transcrevo a receita que publicamos como parte do Cardápio D'Artagnan (extraídas do Grande dicionário de culinária, de Alexandre Dumas).


Retire os filés de três patos, faça cortes transversos e superficiais no lado da pele, e deixe-os marinar com cebola, salsa, pimenta em grão etc.; na hora de servir, ponha duas colheres de azeite numa frigideira quente, disponha os filés com o lado da pele para baixo, deixe uns dois minutos, vire-os do outro lado, corrija o sal e a pimenta. Sirva com o molho de laranja, que deve ser preparado da seguinte forma: faça um suco de laranja, coe e reserve num jarro de cerâmica; corte em duas as metades das laranjas das quais você fez o suco e retire toda a polpa; corte a casca em tiras fininhas e ponha na água fervente por um minuto, retire do fogo e escorra. Junte as cascas a um caldo de carne bem encorpado, com uma pitada de pimenta moída grosseiramente. Acrescente o suco de laranja e cubra os filés (magrets) com esse molho.









  



sábado, 9 de julho de 2011

Frio, botas e caciocavallo





Faz um frio anormal, e o balneário carioca se enche de agasalhos. Eu calço logo as botas. Se é pra passar frio, vamos aproveitar e usar um modelito à inglesa.


É hora de abrir as refeições com uma boa sopa, completar com uma massa al dente, finalizar com uma sobremesa de recompensa... Vale quase tudo.


A sopa vai ser um creme de cenoura com petits pois. Ervilhas frescas e cenouras compradas hoje na feira da Gávea, na barraca do Adilson (cel.21 9996-7317). As verduras e legumes são de ótima qualidade, e é lá que eu me abasteço.


Adilson


Cozinho as cenouras com pouca água, numa panela de fundo grosso. Ponho sal quando já estão cozidas e bato no liquidificador com 1 dente de alho e 2 colheres de sopa de óleo de gergelim. Junto os petits pois ao creme beeemmmmmm quente. Cozinham só nesse susto. Ao final, uma pitada de cominho em pó. Os perfumes quentes do gergelim e do cominho dão um toque especial.


E o caciocavallo? É um queijo de leite de vaca, curado, originalmente feito com leite de jumenta. Talvez um primo do provolone. O spaghetti cacio e pepe é feito de 4 ingredientes: o queijo, que pode ser o pecorino, a pimenta-do-reino preta, a massa e a água de cozimento. O ideal é ralar o queijo - cacio ou pecorino - no ralo grosso. Cozinho a massa al dente, de preferência uma massa longa, misturo a massa quente ao queijo com umas duas conchas da água de cozimento, e bastante pimenta-do-reino moída na hora. E aí temos o cacio & pepe, uma instituição italiana.


Se bebem, um bom tinto, por favor.




Para completar, e pegar mesmo pesado, petits pots de crème au chocolat. Tradução: um potinho com um creme gelado, mas bem mingauzinho. Sobremesa pra regredir mesmo.
Depois, é pegar a chupeta e ir pra cama.


Levo 2 copos de leite para ferver com 1/2 xícara de açúcar, um pedaço de casca de laranja, os grãos de 3 favas de cardamomo e uma colher de sopa de mel de flor de laranjeira. Desligo o fogo e deixo a infusão incorporar os perfumes, panela tampada. Enquanto isso, derreto 160g (um tablete grande) de chocolate meio-amargo (55% a 60%) com uma colher de sopa de café forte. Pode ser um expresso dos bons.






Acrescento 4 gemas, uma a uma, fora do fogo. Quando a mistura de chocolate está  firme, vou despejando o leite quente até ficar uma composição bem lisa. Levo ao fogo para engrossar, mexendo sem parar. Passo por uma peneira fina e distribuo o creme em potinhos ou ramequins ou xícaras de café. Deixo esfriar. Ponho para gelar por umas 5 horas, pelo menos. E tiro da geladeira uma meia hora antes de servir. Eu adoro. Tem um toque turco, com a mistura de café e cardamomo, e a casca de laranja harmoniza o conjunto. Experimente.  



quarta-feira, 6 de julho de 2011

Yes, cupcakes!







Yes, vamos falar de cupcakes! Em Portugal, posso apostar, estaríamos falando de queques [ingl.cake]. Aqui, para o bem e para o mal, nossa língua aceita acordos. Nem sempre de mão-dupla.


Hoje, em bom português, no Brasil, comemos bolinhos pequenos assados em forminhas de papel, a que chamamos cupcakes. Geralmente, coberturas mirabolantes enfeitam o topo desses bolinhos, e quase sempre me assustam. Coloridas, metálicas, essas criações da química moderna não me apetecem. 


Proponho uma versão comestível dos cupcakes...de chocolate, intenso, com duas opções de cobertura. 


Para os bolinhos: 50g de chocolate meio-amargo, derretido; 100g de farinha de trigo; 1/2 colher de chá de bicarbonato de sódio; 110g de manteiga; 200g açúcar mascavo; 1 ovo; 125ml de água fervente. Bato a manteiga em temperatura ambiente com o açúcar, acrescento o ovo. Junto o chocolate derretido e já frio, e vou, alternadamente,  acrescentando a farinha já misturada ao bicarbonato e a água fervente. Asso por 25 minutos. Deixo esfriar. Preparo a cobertura.

A primeira ideia é cobrir com uma ganache de chocolate: 200 ml de creme de leite fresco e 225g chocolate meio-amargo. Levo o creme ao fogo com o chocolate bem picado até que a mistura fique bem homogênea. Espalho a ganache sobre os bolinhos com as costas de uma colher e, a pedidos, salpico confeitos de chocolate ou castanhas moídas.


A outra cobertura que eu adoro é uma geléia de damasco diluída com um pouco d'água (mineral). No topo, pistaches ou castanhas-de-caju picados. 


P.S.: uma terceira sugestão de cobertura (a da foto) é o merengue italiano: levo ao fogo 3 xícaras de açúcar com uma de água. A calda deve engrossar até ficar em ponto de fio. Bato 6 claras em neve. Vou despejando a calda sobre as claras, sempre junto da borda da tigela, sem parar de bater. 
Quando escrevi, há alguns dias, a receita da mousse de limão(ver Coração mexicano, limão siciliano), disse em detalhes como se faz o merengue. Só pra confirmar. 




  

sábado, 2 de julho de 2011

Pimentas, valham-me!

Pimenta é um santo remédio. Em sentido literal e figurado. Achei boa a lembrança dessa expressão...mas o que vale é que apimenta-se o que precisa ser melhorado. Comida, gente, texto, roupa, relação. Eu vou apimentar o meu prato. 


pimenta dedo-de-moça

pimenta malagueta


Gosto muito de pimenta. Pouca, mas presente, forte. Até a comida ruim se beneficia de uns pingos de um bom molho de pimenta, ou mesmo salva-se.
Em excesso, pode ser um desastre. Nada mal aproveitar para refletir sobre a importância da medida, hybris, conceito grego bastante negligenciado hoje...
 Erram as madames na quantidade de perfume, sufocando um elevador inteiro, erram os privilegiados quando despejam sobre seus herdeiros montanhas de brinquedos de última geração, enfastiando-os, erram os trabalhadores quando compram copinhos, latinhas, queijinhos para seus filhos carentes pensando que estão dando a eles comida cara, portanto, de qualidade. Erramos querendo acertar, sem dúvida. Desde o pecado original é assim. 

É só lembrar que tudo em excesso é negativo. Passa do ponto, que é um balizador tão fundamental pra quem cozinha, namora, compra, fala, educa.





Sem pimenta, não dá; com pimenta demais, também não dá. Preparo o meu próprio molho. Meu avô fornecia molho de pimenta pra família inteira. Agora, é cada um por si, e eu faço a minha parte. Pego um punhado de pimenta malagueta, um de pimenta dedo-de-moça, um de pimenta-biquinho. Retiro os cabinhos, passo um paninho geral porque elas não podem estar molhadas. Escaldo o vidro onde vai ser guardado o molho. As pimentas entram primeiro, depois uma medida de vinagre branco (eu uso o de vinho branco ou maçã) e uma medida de cachaça ou tequila. Hoje vou usar tequila. Uma estrela de anis, um cravo-da-índia, um pedacinho de canela em pau. Ou não. A canela é opcional. Cubro com azeite.
As pimentas ficam ali no vidro esquecidas por uns dias até que amadureçam. Depois, é só usar. Com bom senso.  













sexta-feira, 1 de julho de 2011

Duas ou três versões de taboule

Dos fatos há sempre duas versões, pelo menos: a minha e a sua.

Na cozinha, não é diferente.


O taboule feito há mais de 100 anos em Damasco era mais rico em trigo do que o apresentado hoje nos restaurantes libaneses, cheios de ervas, dizem os estudiosos de sua origem judaica. O taboule servido em Londres, no restaurante dos chefs Samuel & Samantha, o Casa Moro, de influência árabe e espanhola, tem uma versão própria para o inverno, e nós também fazemos com couscous...


É bom saber as duas, três, todas. Para seguir a estação, o taboule de inverno é o da vez. Ponho o triguilho de molho em água morna por 10 minutos. Escorro bem numa peneira e ainda espremo para que os grãos fiquem secos. Corto o bulbo de um funcho pequeno em quadradinhos. Separo a mesma quantidade de couve-flor, só os buquês, sem os talos grossos. Junto uma endívia, também picada, bastante salsa, a metade da dose de hortelã, tudo bem picado, um punhado de nozes, as sementes de uma romã. Faço uma emulsão (é, a proporção de azeite e vinagre, ou o que confere a acidez, é de 3 para 1. Só assim o milagre da emulsão acontece) com 6 colheres de sopa de azeite, 2 de vinagre balsâmico, 1 dente de alho pequeno, sem o germe, picado miudinho, 1 pitada de sal, 1 de canela em pó, uma rodadinha de pimenta-do-reino, 1 colher de sopa de água mineral. Misturo bem com o fouet (o batedor de arame que alguns traduzem como chicote, ao pé da letra). Rego a salada e deixo agir os temperos. Misturo mais uma vez, e sirvo. Em temperatura ambiente, sempre. A salada gelada perde o sabor completamente.


As outras versões são variações sobre o tema. Pode ser triguilho com tomate, pepino, hortelã, salsa, limão, azeite, sal e pimenta, o clássico. Ou o taboule pode ser de quinoa, com tâmaras, amêndoas, abobrinha e cenoura. Servido em copinhos, como manda a modernidade. Ou, ainda, de couscous, a sêmola de grão duro que casa maravilhosamente com frutas e frutos secos ou frescos. 


Solte a imaginação e pense numa coisa só: taboule é uma salada completa, nutritiva, que pode ser comida com folhas tenras de alface, pão, peixe, até com outros legumes. Vai do cru ao cozido.