segunda-feira, 30 de maio de 2011

Chamem os xamãs!

Chamem os xamãs, que eu vou fazer uma sopa de milho verde.

Preparo o caldeirão. Sei que o milho é um alimento que fortalece o corpo e o espírito.  E todos os xamãs, de todos os povos, de todas as tribos, sabem que o milho tem seu valor. É alimento de criança e de guerreiro.

Dois dentes de alho socados com 3 folhas de sálvia vão ser refogados num bom azeite, no fundo do caldeirão. As espigas de milho, raladas. Umas 4 ou 5. Junto a elas um pouco de leite, e espremo naqueles coadores de comida viva. Um pedaço de pano fino também faz o serviço.

Vou cozinhar o "leite" de milho junto com o azeite já perfumado pelo alho e pela sálvia. E acrescento um pouco d'água, aos poucos. Vai virar um anguzinho mole, e aí vou diluindo com mais água. E confirmo o cozimento com mais alguns minutos ao fogo.  Tempero com sal e pimenta-do-reino moída na hora. Algumas folhas de sálvia fritas no azeite enfeitam o conjunto, e um pouco do melhor queijo parmesão disponível pode ser servido à parte.

Melhor seria servir a sopa de milho numa oca com vista para o mar. Se tiver uma lua no céu, é sinal  infalível de boa sorte. Experimente. Com ou sem lua. O céu da boca vai se encher de estrelas, decerto.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Uma palavra basca

A geladeira está vazia, a despensa desprovida, a barriga roncando? Vejo essa situação como uma oportunidade de criar, inventar. A dificuldade impulsiona...como disse Mallarmé no seu Um lance de dados, os sapatos apertados criam novos passos de dança...

Vou pra cozinha com essa inspiração. Com cenoura, cebola, aipo, alho-poró e um buquê de ervas poderia fazer um bom caldo. Afinal, a base da boa cozinha é um bom caldo. Mas só tenho um ramo de salsa, uma cebola, um nabo? Vale! E desisto do caldo, claro. Vou saltear o nabo na manteiga ou no azeite com a cebola, um punhadinho de açúcar, sal, pimenta-do-reino. A salsinha vai picada por cima. 
  

Se temos lentilha, pode sair uma sopa, uma boa sopa. A ideia é cozinhar as lentilhas em água pura. Acrescentar cebola picadinha, a roxa, então,seria um luxo,tomates sem pele, em cubinhos, um fio de azeite,ervas frescas(vale tudo: coentro, manjericão, tomilho, manjerona,cerefólio, salsa)e um toque final majestoso: piment d'espelette. Comi uma sopa memorável, em Nice, num restaurante com muitas estrelas, que juntava feijão branco, conchinhas de massa, azeite e ...piment d'espelette. Essa nota basca dá uma força revolucionária a um prato de sopa! Permita-se a experiência,e depois, compartilhe. Tipo kiss and tell...

quarta-feira, 18 de maio de 2011

uma palavra a quem tem fome...de palavras

Escrever para quem tem fome (de palavras ou de comida) pode ser meu gesto mais audacioso dos últimos tempos. Tomada a decisão, aqui na Bahia, começo com uma receita de pão-de-especiarias [fr. pain d'épices].  

Peço calma aos que começam a se inquietar. Não, hoje não falo da cozinha baiana. Outro dia, quem sabe.  Estar na Bahia é circunstância que me encanta, mas não me determina o gosto, a paixão, a gula. O acarajé vem depois.


O bom pão-de-especiarias é feito com farinha de centeio, mel e... especiarias. Anis estrelado, canela, cravo, pimenta, gengibre. Aqui, improviso. Fervo o mel (200g) com um pouco de açúcar mascavo, um copo d'água e 3 estrelas de anis. Deixo esfriar um pouco. Despejo sobre frutas secas e castanhas picadas. Junto a farinha peneirada com uma colher de chá de fermento em pó, outra de bicarbonato de sódio, até dar ponto. A consistência esperada é a de orelha de criança.

Asso por 50 minutos em forno pré-aquecido (200ºC). Deixo esfriar, e embrulho em papel-manteiga por 24 horas, para que se apurem os perfumes das especiarias. Fica ótimo com frutas cozidas, no inverno, com frutas frescas e sorvete, no verão. Há quem goste com patê, foie-gras e outras violências. Mas isso já é outra história.